Pensamentos Cartesianos x Sistêmicos

Pensamentos Cartesianos x Sistêmicos

Pensamento Cartesiano x Sistêmico

Existe um debate em algumas áreas do conhecimento humano que reivindica uma nova visão de mundo que propõe a superar a crise epistemológica que se abate sobre a ciência, sobre a tecnologia, sobre a educação, sobre a cultura, e sobre a sociedade. Esse debate visa superar o excesso de cartesianismo causada pelo excesso de racionalismo, existente na sociedade, na ciência, na educação ocasionado pela extrema fragmentação do conhecimento, da educação, da ciência e da própria pessoa humana. Essa nova visão de mundo reivindicada seria a visão sistêmica que se opõe ao cartesianismo.

O Pensamento Cartesiano
Renê Descartes foi um filosofo cuja característica é a racionalidade e objetividade, sua preocupação era com a ordem, a clareza e a distinção. Descartes propôs fazer uma ciência essencialmente pratica e não especulativa, queria disciplinar a ciência e isso seria possível com um bom método. Esse método seria universal, inspirado no rigor matemático e racionalista. O método cartesiano está fundamentado no princípio de jamais acreditar em nada que não tivesse fundamento para provar a verdade. Com essa regra nunca se aceitará o falso por verdadeiro e se chegará ao verdadeiro conhecimento de tudo.
Para reconhecer algo como verdadeiro, ele considera necessário usar a razão, o raciocínio como filtro e decompor esse algo em partes isoladas, em ideias claras e distintas, ou seja, propõe fragmentar, dividir o objeto de estudo a fim de melhor entender, compreender, estudar, questionar, analisar, criticar, o todo, o sistema.
Para Descartes, nem os sentidos, que podem enganar-nos, nem as idéias, que são confusas, podem nos dar certezas e, portanto, nos conduzir ao entendimento da realidade. Por isso, com a finalidade de estabelecer um método de pensamento que permita chegar à verdade – no seu livro “O Discurso do Método” – Descartes propõe que só se considere como verdadeiro o que for evidente, o que for intuível com clareza e precisão racional.

O Pensamento Sistêmico
O pensamento sistêmico, de uma forma geral, pode ser definido como uma nova forma de percepção da realidade. Segundo Capra (1996) quanto mais são estudados os problemas de nossa época, mais se percebe que eles não podem ser entendidos isoladamente como no modelo cartesiano. São problemas sistêmicos, o que significa que estão interligados e são interdependentes. Deve-se sempre partir do princípio de que o todo e mais que a soma das partes, tendo desta forma o sistema como um todo integrado cujas propriedades essenciais surgem das inter-relações entre suas partes.
Entender a realidade sistemicamente significa, literalmente, colocá-la dentro de um contexto e estabelecer a natureza de suas relações.

Segundo Behrens o pensamento sistêmico pode ser definido como: “O pensamento sistêmico contrapõe o cartesianismo é uma forma de abordagem da realidade que surgiu no século XX, em contraposição ao pensamento reducionista, ou cartesiano, que visava a fragmentação. É visto como componente do paradigma emergente, que tem como representantes cientistas, pesquisadores, filósofos e intelectuais de vários campos. Por definição, o pensamento sistêmico inclui a interdisciplinaridade” (BEHRENS, 2005, p.53).

Ainda segundo Capra, a ciência deve estar mais aberta a realidade do todo e não a uma parte deste todo. A ciência sistêmica mostra que os sistemas não podem ser compreendidos por meio da análise individual. As propriedades das partes não são necessariamente propriedades extrínsecas, mas precisam ser vistas e entendidas dentro do contexto do todo. Nessa perspectiva o pensamento cartesiano e o pensamento sistêmico apesar de cada qual possuir uma identidade, método e história diferentes, não são diretamente opostos, apenas tomaram caminhos diferentes, visando chegar a algo comum, pensando na busca da verdade do todo (CAPRA 1996, p. 51).

Capra (1996) apresenta a ideia de inter-relação entre os objetos e seres vivos, as coisas não são separadas, apenas ficam separadas momentaneamente ou mesmo aparentam estar separadas, no entanto temos que ter cuidado com a ilusão, pois a realidade pode ser outra. Os objetos e os seres vivos estão em constante relação, há uma troca tanto subjetiva como objetiva nessas relações, não podendo ser estudadas, vistas, analisadas, entendidas separadamente.

Entendemos que o pensamento cartesiano a partir da racionalidade teve, tem e tudo indica continuará a ter, uma enorme contribuição para a ciência e para a educação, porém não podemos mais aceitar a ideia de que para haver racionalização tem que haver fragmentação. O ser humano não é uma pessoa fragmentada, seu corpo, sua mente, estão diretamente ligadas, precisamos assim entender este ser humano num todo e não mais em partes.

O mesmo processo vale para a educação. Não há mais uma ou outra disciplina mais ou menos importante, pois todas tem algo a contribuir na formação integral do Cidadão. Precisamos assim de um novo paradigma para o ser humano, para a ciência, para a educação. Precisamos de um paradigma sistêmico que visualize as situações num processo integral e não fragmentado. Um novo paradigma precisa ser construído para a ciência, para a educação, para a tecnologia e para a sociedade. A fragmentação é viável e aceitável na medida em que a mesma pense no todo, porém não é isto que está acontecendo tanto no meio cientifico como no social, cultural e político.

Bateson e Watzlawick preconizaram que a teoria também abarca os cinco axiomas que são: 1) É impossível não comunicar; 2) Toda comunicação tem aspecto de relato (conteúdo) e de ordem (relação); 3) A natureza de uma relação está na contingência da pontuação das sequências comunicacionais entre os comunicantes (cada comportamento é causa e efeito do outro); 4) Os seres humanos se comunicam de maneira digital (comunicação verbal) e analógica (comunicação não-verbal); e 5) Todas as permutas comunicacionais ou são simétricas ou complementares, e estão baseadas na igualdade ou na diferença (Watzlawick et al. 1973).
Bateson concebeu um conceito novo e radical de mente, capaz de superar a visão cartesiana. Mente é um fenômeno sistêmico característico dos seres vivos, uma característica relacional. A mente não está no cérebro e sim nas relações. Também nega a objetividade da realidade quando afirma que o observador traz a marca de quem observa. Não existe, portanto, uma realidade objetiva, independente do observador (Vasconcellos, 2010), conforme já explicitado no pressuposto da intersubjetividade. A compreensão dos padrões comunicacionais que possibilitam ou dificultam as relações são de suma importância para aqueles que trabalham dentro do paradigma sistêmico.

Entre os mais importantes autores no âmbito da terapia familiar e do seu desenvolvimento, encontra-se Milton Erickson (psiquiatra americano) que desenvolveu a história clínica e uma forma muito particular de fazer terapia assente numa invulgar intervenção terapêutica. Embora nunca se tenha centrado no trabalho terapêutico com famílias, influenciou em muito as ideias dos homens de Palo Alto (CA,USA).
Também não devemos ignorar as contribuições de Bateson (1904-1980), que depois de formações em Biologia, trabalhos de cibernética com Foerster, N.Wiener e K.Lewin, vai para Palo Alto, com um convite para participar num projeto, aplicando os conceitos sistêmicos à comunicação, e desta à psicopatologia e psicoterapia da esquizofrenia (RELVAS, 1999).

Na área “psi”, podemos ressaltar algumas postulações teóricas de autores que colaboram para o surgimento da terapia familiar. Um importante precursor, sem dúvida, foi Adler que enfatiza, na sua teoria do desenvolvimento da personalidade, a importância dos papéis sociais e das relações entre estes papéis na etiologia da patologia.

Influenciado pelas teorias de Adler, Sullivan coloca que a doença mental tem origem nas relações interpessoais perturbadas e que um entendimento mais completo do indivíduo só pode ser alcançado no contexto de sua família e de seus grupos sociais. Sullivan coloca, assim, a patologia na relação, na dimensão interacional (CARNEIRO, 1996).

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